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Compliance ainda é desafiador em empresas familiares

Modelo de sucessão e de continuidade, informalidade nas relações profissionais e mais possibilidade de existirem conflitos são alguns dos motivos

Empresas familiares têm algumas especificidades que podem fazer com que a implementação efetiva de práticas de compliance seja uma tarefa desafiadora. A forma de sucessão e de continuidade, a informalidade nas relações profissionais e a possibilidade de existirem conflitos familiares são alguns exemplos. 

Conforme definição do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), um negócio familiar é a conexão entre dois sistemas diferentes e separados, que são a família e a firma. Essas organizações podem contar com diversos membros familiares tanto na parte administrativa quanto como integrantes da diretoria e acionistas. 

Não é necessário, contudo, que todos os funcionários sejam parte da mesma família para que um negócio seja considerado familiar. Além disso, como apontado pelo Sebrae, uma pessoa de fora desse núcleo sanguíneo pode fazer a gestão e, nem por isso, a empresa deixa de se encaixar na categoria. É preciso apenas que figuras familiares estejam no quadro de diretores ou acionistas, por exemplo.

Nesse contexto, vale lembrar que o termo “compliance” vem do inglês “to comply” e, no âmbito corporativo, faz referência à conformidade com leis, normas éticas, políticas e diretrizes externas formuladas por órgãos reguladores. A ideia é manter a integridade e a transparência nos processos organizacionais.

Assim, no caso das empresas familiares, essa proposta pode contar com níveis extras de complexidade, por conta da sobreposição de interesses pessoais e empresariais, por exemplo. Essa dinâmica cria um ambiente propício a dilemas éticos e desafios específicos de conformidade.

Governança corporativa representa desafios e soluções para o empreendedorismo familiar 

O empreendedorismo tem a sua base no modelo de empresa familiar. Para se ter uma ideia, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia (IBGE) e do Sebrae, as companhias familiares integram 90% dos negócios no país e são responsáveis por cerca de 65% do PIB nacional. Além disso, elas empregam 75% dos profissionais em território brasileiro. 

O limiar entre a esfera familiar e o negócio em si, contudo, pode não ser muito claro, como enfatiza o Sebrae, levando à possibilidade de haver maior dificuldade para separar questões emocionais e racionais. Outro ponto é que os laços afetivos têm influência direta nas relações, nos comportamentos e nas decisões tomadas para o negócio em família.

Essa configuração faz com que conflitos e divergências sejam comuns nesse ambiente. Segundo um estudo da PwC – multinacional de consultoria e auditoria – somente 16% dos empresários entrevistados no Brasil nunca passaram por uma discordância na companhia da família. 

De acordo com o Código das Melhores Práticas do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), a relação entre sócios, conselho de administração e demais partes interessadas de uma empresa é abrangida e direcionada pelo sistema de governança corporativa. Dessa maneira, à medida que uma organização cresce, a governança se torna ainda mais fundamental para orientar sua trajetória e alcançar os resultados projetados.

Com base nos valores e na definição de regras e papéis, no caso da gestão familiar, esse sistema também guia as relações e as atividades empresariais da família, conforme o IBGC. O foco da governança, nesse sentido, é estabelecer uma  separação clara e objetiva entre propriedade e gestão. Com isso, é possível reduzir os conflitos na sucessão, fortalecer a imagem da empresa e, consequentemente, contribuir para a sua longevidade.

Governança atrai confiança do consumidor e melhora desempenho das empresas

Segundo análises feitas pela Pesquisa Anual Global de CEOs, da PwC, o segundo fator que mais afeta o desempenho de uma companhia é o nível de confiança que o consumidor deposita nela. Esse quesito fica atrás somente de condições específicas da própria indústria.

A “fórmula” mais atual de confiança para esse cenário exige, por exemplo, credenciais sólidas de ESG – governança ambiental, social e corporativa. No estudo Global Consumer Insights Pulse Survey 2022, da PwC, 70% dos entrevistados afirmaram estar dispostos a pagar mais caro por alimentos feitos de maneira ética. 

A pesquisa foi conduzida com a participação de mais de 9 mil consumidores de 25 países diferentes. Na sua edição anterior, 50% dos consumidores disseram que as práticas de ESG tiveram influência na sua confiança em uma companhia, ou marca, e na sua escolha de recomendá-la a outras pessoas. 

De acordo com esses levantamentos, para percorrer a direção certa, a empresa deve contar com uma estratégia de ESG bem delimitada e ter uma comunicação de mão dupla que abranja canais para receber o feedback dos clientes. Líderes entrevistados na Pesquisa de Empresas Familiares 2023, também da PwC, contudo, não apontaram as questões ESG como prioridade máxima.

Para traçar uma estratégia ESG eficaz, é indicado ainda avaliar o desempenho com base em metas financeiras e não financeiras. Além disso, a diversidade também é apontada como crucial, especialmente para atrair consumidores das gerações Y e Z.

Apenas 10% das empresas familiares brasileiras, no entanto, estabelecem metas para Diversidade, Equidade e Inclusão (DEI) e 20% o fazem para impacto social. Os objetivos têm, todavia, uma rotina importante de medição de crescimento e satisfação do consumidor. Segundo a pesquisa, as empresas familiares, em termos mundiais, não priorizam ESG e DEI, mesmo na Europa (20%) e na América do Norte (8%). 

Negócios de família que se preocupam com ESG, DEI e questões sociais são mais otimistas em relação ao que esperar do futuro. Aqueles que priorizam a atração e retenção de talentos, por exemplo, contam com uma perspectiva de crescimento mais intensa (49%) quando comparados àquelas que não priorizam esses aspectos (40%).